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Chile define hoje segundo turno que pode consolidar nova guinada à direita | Mundo

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Em meio a uma agenda dominada pelo temor à criminalidade e à migração desenfreada, os chilenos voltarão às urnas no domingo para eleger seu governante para os próximos quatro anos, em uma eleição que pode marcar a guinada mais extrema à direita desde a ditadura militar de Augusto Pinochet.

O ultradireitista José Antonio Kast chega ao segundo turno com ampla vantagem nas pesquisas de intenção de voto — em torno de 60% — na disputa contra a candidata do governo, a comunista Jeannette Jara.

Diferentemente de quatro anos atrás, quando as liberdades individuais e as demandas por reformas estruturais colocaram em xeque o sistema político chileno, neste ano a criminalidade eclipsou a economia, a saúde e a educação como principal preocupação da população.

Lado a lado na lista de inquietações dos cidadãos está também a chegada massiva, a partir de 2019, de milhares de estrangeiros, sobretudo venezuelanos. Muitos setores, inclusive do governo que deixa o poder, têm associado a migração descontrolada ao aumento da violência urbana.

“A criminalidade é algo a que não estávamos acostumados no nível que existe agora”, disse à Associated Press a aposentada Norma Ayala, de 67 anos. “E mudou muito, embora soe mal, com a chegada de tantos estrangeiros.”

Ayala faz parte dos quase dois terços dos chilenos que apontam a violência como seu maior temor: 63% dos cidadãos disseram que essa é sua principal preocupação, enquanto a imigração foi motivo de inquietação para 40% dos entrevistados no relatório Preocupações do Mundo, divulgado em novembro pelo Ipsos, que coleta mensalmente a percepção de cerca de 25 mil pessoas em aproximadamente 30 países.

Embora continue sendo um dos países mais seguros da América Latina, o Chile viu a taxa de homicídios dobrar na última década, passando de 2,32 por 100 mil habitantes em 2015 para 6,0 em 2024.

Fronteiras fechadas e expulsões em massa

Ao longo da campanha, tanto Jara quanto Kast — fundador do Partido Republicano — endossaram medidas para mitigar a insegurança e endurecer a política migratória no país, onde os estrangeiros representam quase 9% dos 18,5 milhões de habitantes.

Mas apresentaram roteiros completamente distintos.

Jara, que busca dar continuidade às políticas implementadas pelo governo do presidente Gabriel Boric, propõe medidas mais moderadas para conter o fluxo migratório, incluindo um registro oficial dos mais de 330 mil migrantes sem documentos que atualmente vivem no Chile.

No combate ao crime, defende a construção de mais presídios, a modernização dos aparatos policial e estatal e a criação de equipes especializadas para rastrear e eliminar o dinheiro de origem ilícita que alimenta as organizações criminosas.

De olho no segundo turno, Jara endureceu o discurso e defendeu a expulsão de estrangeiros que não se registrem ou que tenham cometido crimes no Chile. Também não descartou decretar Estado de Emergência “se necessário”, em um gesto para conquistar o centro político, que exige medidas mais contundentes diante da onda de insegurança.

Kast, por sua vez, promete implementar um governo de mão dura nos moldes do presidente Nayib Bukele, cuja megaprisão em El Salvador ele chegou a visitar.

Seu plano de governo inclui ainda medidas como a construção de centros de detenção e expulsão de migrantes, a instalação de muros, cercas e valas na fronteira e maior poder de ação para as forças de segurança. “Aqueles que tentarem entrar de forma violenta ou desobedecer às ordens serão contidos com protocolos rigorosos”, alerta seu programa.

Propostas econômicas para recuperar o país

Kast prometeu impulsionar o investimento, reduzir entraves burocráticos e melhorar as condições para a geração de empregos. Seu plano de governo também prevê o corte de cerca de US$ 6 bilhões em gastos para reduzir o tamanho do Estado e aliviar o orçamento.

Jara, por sua vez, propõe uma economia que combine crescimento com proteção social, aumento da produtividade e fortalecimento do trabalho formal. Para isso, concentrou suas propostas na manutenção e ampliação de alguns benefícios obtidos durante o governo Boric.

Entre eles, destacam-se o salário mínimo em torno de US$ 815 mensais, a limitação de reajustes sistemáticos nas áreas de saúde e educação e a redução das contas de luz.

O primeiro turno das eleições foi marcado por alto grau de polarização e pela disputa entre extremos do espectro político, algo que não ocorria desde a redemocratização do país, em 1990.

Essas eleições presidenciais ocorrem ainda em um contexto no qual, pela primeira vez, o voto é totalmente obrigatório.

Segundo as últimas pesquisas antes do início do período de silêncio eleitoral, o percentual de eleitores que afirmaram não ter decidido seu voto ou que pretendem votar nulo ou em branco varia entre 17% e 20% — número elevado também pelo desencanto de um eleitorado pouco satisfeito com posições mais extremas.

“Nenhum dos dois candidatos, pelo menos para mim, me representa, e sinto que para muita gente também não representa”, disse à AP o artista visual Gonzalo Medel. “No fim das contas, acaba sendo o mesmo de sempre: você vota no mal menor.”

Na tentativa de conquistar esse segmento do eleitorado, tanto Jara quanto Kast moderaram seus discursos e incorporaram propostas de outros candidatos, em especial num aceno aos eleitores do economista Franco Parisi, que terminou o primeiro turno em terceiro lugar, com quase 20% dos votos.

Seus eleitores são diversos e difíceis de classificar: vão desde jovens desconfiados das instituições até trabalhadores e empresários, passando por descontentes com a classe política e aqueles que não se sentem representados por ninguém. O grupo se tornou, assim, um valioso espólio eleitoral disputado por Jara e Kast.

“Os dois candidatos estão jogando para não se definir muito em temas que possam lhes tirar votos”, afirmou à AP a cientista política Claudia Heiss, da Universidade do Chile. “Eles tentaram esconder elementos que possam ser percebidos como prejudiciais para esses votos indecisos”, acrescentou.

Jara apostou em se distanciar ainda mais de seu Partido Comunista e anunciou que deixará a legenda caso seja eleita. Também incorporou propostas de outros candidatos, como a devolução do imposto sobre valor agregado de medicamentos e estímulos financeiros para jovens.

Kast, por sua vez, advogado contrário ao aborto e ao casamento igualitário, adotou um tom mais conciliador e afirmou que, em um eventual governo, “nenhum direito adquirido será retirado”.

Além disso, nos últimos dias, enfatizou que acolherá “qualquer pessoa que queira apoiar as ideias da liberdade”.

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